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Artigos 11/07/23

O enquadramento jurídico dos animais de estimação e o avanço do Projeto Lei 27/2018 e Projeto Lei 179/2023

Por décadas em nosso ordenamento jurídicos os animais de estimação são caracterizados como coisa, bem semovente.

Ao longo da última década, os operadores do Direito, dada a relevância jurídica do tema, embora a jurisprudência tenha mantido a natureza de coisa, de bem semovente, começaram a se debruçar sobre o enquadramento jurídico dos bichos de estimação, por entenderem que essa qualificação de coisa não mais resolve a controvérsia do debate.

Novas problemáticas e questionamentos surgiram sobre o assunto.

Em primeiro lugar: é possível reconhecer o direito de visitas após a ruptura do casamento ou união estável? O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo que sim, é possível a delimitação do direito de visitas ao animal de estimação que ficou com o ex-companheiro.

Sobre tal entendimento, o Superior Tribunal de Justiça consignou que “não se mostra suficiente o regramento jurídico dos bens para resolver, satisfatoriamente, tal disputa familiar nos tempos atuais, como se se tratasse de simples discussão atinente à posse e à propriedade.”.

Para o Ministro Luis Felipe Salomão, o direito de propriedade não pode ser exercido de maneira idêntica àquele relativo às coisas inanimadas ou que não dotadas de sensibilidade, haja vista que os animais de estimação como seres sencientes gozam de natureza especial e devem ter o seu bem-estar considerado.

Assim, acerca do enquadramento jurídico dos animais de estimação, discute-se a existência jurídica de um terceiro

gênero, no qual a análise do caso concreto deve ser voltada para proteção do ser humano e de seu vínculo afetivo com o animal.

Outra questão que costuma chegar ao Judiciário é se é possível atribuir aos ex-cônjuges e ex-companheiros o dever de contribuir para o pagamento das despesas dos animais após o fim do relacionamento?

Em um dos casos emblemáticos sobre a matéria, uma das partes alegou que após a ruptura do casal a parte contrária teria deixado de contribuir para a manutenção dos animais, onerando sobremaneira a parte que havia ficado com o animal.

Ao analisar o caso, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo considerou não existir regramento legal sobre o tema, mas fundamentou a obrigatoriedade do dever de contribuir com base nos princípios gerais do direito, dentre eles a vedação ao enriquecimento sem causa de uma das partes.

Em sede recursal, decidiu a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial nº 1.944.228, que (i) o custeio de despesas dos animais são obrigações inerentes à condição de dono; (ii) deve haver a compatibilização das regras sob o regime de bens com a natureza dos animais, seres dotados de sensibilidade.

Eis que preenchido os critérios desenvolvidos ao longo do voto (condição de dono e compatibilização do regime de bens), concluiu o Superior Tribunal de Justiça que não seria possível atribuir ao ex-companheiro que não ficou com o animal de estimação a obrigação de custear as suas despesas.

Em paralelo às construções jurisprudenciais sobre o tema, o Senado Federal, em 2019, aprovou o PCL 27/2018, para que os animais deixem de ser considerados objetos e passem a ter uma natureza jurídica sui generis, como sujeitos de direitos despersonificados.

Propõe o Poder Legislativo a alteração do Código Civil para que os animais sejam considerados seres sencientes, e não apenas semoventes (caracterização vigente).

No ano de 2023, a Câmara dos Deputados recepcionou o PL 179/2023, cujo objetivo é regulamentar a família multiespécie que, ao que aqui importa, é aquela formada por seres humanos e animais de estimação, a fim de prever direitos, tais como, pensão alimentícia e participação no testamento do tutor.

Almeja-se que os animais de estimação sejam considerados filhos por afetividade, sujeitos ao poder familiar, além da legitimidade para postular para a defesa de seus interesses, mediante representação dos tutores.

É um tema interessante e ainda em desenvolvimento legislativo e jurisprudencial.

O TMM advogados encontra-se à disposição para auxiliar os seus clientes em assuntos relacionados ao tema.